Feridas Neoplásicas: conceitos e cuidados
- Liga Acadêmica de Estomas e Feridas - UFMA
- 29 de abr. de 2021
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As neoplasias são consideradas um problema de saúde pública de grande importância, estando já entre as principais causas de morte prematura na maioria dos países do mundo. No Brasil, o INCA estimou 625 mil novos casos de câncer para cada ano do triênio 2020-2022.
As neoplasias apresentam diversas complicações, entre elas o desenvolvimento das feridas neoplásicas, que são feridas de difícil manejo e que trazem grandes repercussões na qualidade de vida do paciente acometido.
As feridas neoplásicas podem ser encontradas em 5 a 10% das pessoas com algum tipo de câncer e podem também ser chamadas de ferida maligna, ferida tumoral, ferida oncológica, etc.
O processo de formação das feridas neoplásicas compreende
O crescimento do tumor, que leva ao rompimento cutâneo;
A neovascularização, que promove mais substratos para esse crescimento tumoral;
A invasão da membrana basal das células saudáveis que promove um crescimento expansivo da ferida na superfície acometida.
Para o manejo dessas feridas é necessária uma avaliação do paciente como um todo e da ferida em si. É importante coletar os dados sobre a história da doença, estágio, avaliação nutricional, tratamentos realizados e em curso, situação sócio econômica, emocional, educacional (conhecimento sobre a doença) e a influência da família no cuidado.
Na avaliação da ferida, é necessário atentar para: Localização, tamanho, cor, odor, exsudato, sangramento, dor, prurido, descamação, sinais de infecção e o acometimento ou invasão de órgãos e sistemas.
Por meio dessa avaliação serão estabelecidas as melhores condutas e coberturas apropriadas para o manejo da ferida, a fim de proporcionar melhor conforto e qualidade de vida para o paciente e família.
Entre os cuidados dessa ferida estão a limpeza, manejo do odor, exsudato e prurido, controle de sangramentos, manutenção da umidade no leito, proteção de bordas e a promoção de curativos simétricos a aparência do paciente, sempre que possível.
Quanto aos cuidados específicos, os mesmos serão realizados de acordo com a presença ou não dos sinais e sintomas comuns nesse tipo de ferida.
Para o manejo da dor, é necessária a avaliação do nível de dor antes, durante e após a realização do curativo, com o uso de escalas padronizadas. Deve-se realizar a analgesia prévia, por via oral, endovenosa, subcutânea ou tópica, e a manutenção com doses de resgate/SOS, se necessário. Sempre avaliar e discutir com a equipe a necessidade de alteração dos esquemas analgésicos prescrito, o uso de anti-inflamatórios, a radioterapia antiálgica ou cirurgia.
Além desses cuidados é necessário ainda remover os adesivos cuidadosamente, realizar a limpeza com técnica cautelosa e utilizar coberturas não aderentes e que permitam redução no número de trocas, como formas de tentar minimizar a dor do paciente.
Em relação ao manejo do exsudato é necessário o uso de curativos absortivos, como o alginato de cálcio e o carvão ativado, além de compressas/gazes como cobertura secundária. Deve-se ainda atentar para a proteção da pele ao redor, com o uso de creme barreira/óxido de zinco nas bordas da e pele peri-ferida.
O prurido também ocorre de forma rotineira nessas lesões e trazem bastante incomodo ao paciente. Deve ser verificada a causa, que pode ser devido ao uso dos adesivos, ao exsudato, pelo próprio tumor e ainda devido a candidíase. Dessa forma, deve-se utilizar adesivos hipoalergêncios, realizar a proteção com creme barreira e ainda considerar junto a equipe médica o uso da dexametasona creme a 0,1% nas áreas com prurido, a necessidade de terapia sistêmica e o uso da sulfadiazina de prata a 1%, em caso de candidíase.
Em relação ao sangramento, este também pode ser comum nessas feridas por serem muito friáveis devido a alta vascularização. Manter o meio úmido e evitar aderência das coberturas no sítio da ferida, utilizando curativos não aderentes, são formas de prevenir sua ocorrência. Em caso de sangramento, deve-se aplicar pressão direta sobre os vasos sangrantes, curativos hemostáticos, o alginato de cálcio. É necessário discutir com a equipe médica a possibilidade de tratamento com coagulante sistêmico, intervenção cirúrgica e radioterapia anti-hemorrágica.
O odor é um dos maiores problemas das feridas neoplásicas e podem ser manejados com a limpeza cuidadosa e uso de coberturas apropriadas. Para a limpeza pode-se utilizar o soro fisiológico a 0,9% + antissepsia com clorexidina degermante a 2% OU Polihexametileno Biguanida (PHMB) solução. Além disso pode-se fazer uso de coberturas com prata ou com o carvão ativado. Outra opção é o uso do metronidazol gel 0,8% de forma tópica e ainda a associação sistêmica que deve ser considerada junto a equipe médica em casos de odor grau II ou III.
Pode-se alternativamente utilizar por via tópica, ou seja, diretamente sobre o leito da ferida, comprimidos macerados na proporção de 1 comprimido de 250 mg para 50 ml de soro fisiológico a 0,9%, ou água destilada, ou ainda a solução injetável, que deve ser administrada pura, sem diluir. Esta forma de utilização deve ser reservada apenas para as situações em que seja realmente impossível obter a apresentação do metronidazol em gel a 0,8%.
Diante desses cuidados apresentados, é importante sempre atentar para o fato de que os curativos e coberturas utilizados não cicatrizarão uma ferida neoplásica. Essa cicatrização será obtida por meio do tratamento da doença de base, curativo ou paliativo, ou seja, por meio da quimioterapia, radioterapia, cirurgia e outras modalidades de tratamento.
A cicatrização da ferida neoplásica nem sempre será possível, mas isso não significa que elas sejam intratáveis. Os cuidados com a feridas neoplásicas devem ser realizados de forma a proporcionar conforto e melhor qualidade de vida para paciente e família.
Referências:
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